

Toda vez que eu vejo alguém fazendo alguma coisa que eu não sei fazer, mas gostaria, fico pirando. Fico imaginando o quão especial, bem dotada, iluminada esta pessoa é. Fico assim quando vejo uma ilustração foda, um cara falando francês ou alguém cozinhando rocambole vegetariano. É óbvio que o bicho que super ilustra não começou ontem, o cara que fala francês tá nesta faz tempo e o rocambole só sai aquela maravilha porque muitos outros deram errado. Só que parece místico porque não fui eu que passei pelo processo e eu fico me enganando que aquele sujeito tem super poderes e por isto faz tudo aquilo que eu não sei.
Andar de bicicleta é a mesma coisa. Muita gente me vê e diz que ‘gostaria de ser assim‘. Um dia, no passado, eu também quis ser assim. Porque um dia eu fui tremendamente atrapalhada. Mesmo coisas que hoje acho simples me fizeram sofrer. Eu não sabia soltar uma mão do guidão para sinalizar, por exemplo. Até hoje eu não sei subir calçadas altas e meu namorado sabe pontuar 400 defeitos em uma descida ou curva minha.
Eu fiquei quase três anos numa lenga lenga. Eu tinha medo de tudo. Empurrava a bicicleta em quase todo o trajeto que não era ciclovia. Eu me desculpava com um sorrisinho amarelo para o porteiro por colocar a minha bicicleta no elevador. Então conheci ‘as pessoas da bike’ e comecei a ir com eles pra lá e pra cá. Foi assim que eu fui desmistificando o pedalar.
Teve um dia que foi um marco na minha vida: o dia que eu subi pedalando pela primeira vez o Morro da Lagoa. Naquele dia, sendo capaz deste grande feito, decidi que nada mais seria impossível de bicicleta.

Foto Vinícius Leyser da Rosa.
O Morro da Lagoa já apareceu bilhões de vezes aqui no Pedal Glamour. Hoje, pra mim, ele é um morro respeitável, que exige calma e paciência. Depois da primeira vez que subi ele pedalando, nunca mais empurrei a bicicleta nele.
Eu já tinha tentando subir ele antes, junto com amigos. A gente ia para uma trilha que saía do mirante e eu achei uma brilhante ideia ir pedalando até lá, afinal, eram só uns 6km de casa. O resultado foi a gente ofegante, empurrando a bicicleta o morro inteiro. Só um dos bravos aventureiros concluiu a empreitada com sucesso (sem empurrar). A descida não foi menos dramática e avaliando hoje, acho que tivemos sorte em chegarmos inteiros lá embaixo. Tudo isto porque, de verdade, não tínhamos muita noção do que estávamos fazendo.

Fotos Sérgio Fregolão.
E eu fiquei carregando este fantasma. Um dia, o Sergio e o Vinícius, decidiram que eu ia sim subir este morro. Era perto do Natal e fazia um calor surreal. O começo da subida foi debouas, mas assim que notei que tinha passado com tranquilidade o trajeto onde tinha desistido na vez anterior, me desesperei. Fiquei sem ar. Parei para beber água e fazer um baita drama. O Sergio registrou tudo.

Foto Sérgio Fregolão.
Chegar lá em cima foi incrível. Senti que poderia fazer muita coisa. Aprendi que muito que o ‘impossível’ era uma questão de se acalmar e aprender com quem sabe.

No fim, apesar do drama, cheguei lá em cima. Foi algo tão incrível que jamais vou esquecer. Ano passado comemorei este aniversário de um ano e graças ao Facebook, tenho o relato de como me senti na época.
Ontem eu completei um ano da primeira vez que subi o Morro da Lagoa pedalando. Eu já usava a bicicleta para transporte e às vezes, carregava garrafas de vinhos e panetones na cestinha, mas subir o morro pedalando foi um marco pra mim.
Foi naquele dia que eu vi que qualquer barreira pode ser enfrentada, desde que com calma, técnica e um pouco de mau humor. Do morro da lagoa pra viagem para Porto Alegre ou as subidas inacreditáveis que tem por aí foi um passo. Não muito pequeno, mas um passo incrível e delicioso.
Hoje não tem subida que eu não tenha vontade de encarar, mesmo que isto muitas vezes inclua sentar e chorar quando eu pareço não aguentar mais. Não virei atleta, aliás, continuo a mesma bêbada preguiçosa e desajeitada de sempre, mas descobri que qualquer morro, distância ou outro objetivo qualquer é totalmente passível de realização.
Fica aí minha dica para quem acredita que pedalar é coisa de outro mundo, de atleta ou de gente que não tem dinheiro para comprar um carro. Pedalar pode ser uma incrível ferramenta de auto realização.
E Vinícius & Fregolão, obrigada por serem meus queridos tutores, que me viram fazer birra, passar mal, quase chorar, mas me levaram até lá com a maior paciência do mundo. Pra sempre vou lembrar deste dia.

Na ‘festa’ de um ano, tentamos repetir a foto. Rolou até um Snikers. Só faltou mesmo a champagne.

Para comemorar os dois anos, a gente errou a data e fomos sem o Fregolão, que se quebrou de bike e não pode ir :p Mas tá valendo mesmo assim, né? Depois rolou um passeio no meio do congestionamento – para os de carro, não pra gente, claro – tão tradicional quanto o aniversário de subida do morro. Fomos até a Praia Mole, vimos que ia chover horrores, nos enfiamos numa padaria nova (e gourmet!) e comemos calorias para três semanas.
Pedalar é isto. Tem aprendizado novo sempre. Você não precisa começar indo super bem. Só de começar, já faz de você alguém que fez muito mais do que a maioria. Baby steps: um passo por vez e um dia você chega onde bem desejar.
Super curti o blog, Naiara!
Beijos
Eba, obrigada, Mariana 🙂 o/ o/ Ficou super feliz em ler isto!
Olá,
cheguei aqui pesquisando sobre bikes urbanas bonitas, mas acabei passeando pelo blog e adorei seu texto.
Morei em Floripa 6 anos e conheço bem estes morros. Nunca subi eles de bicicleta, mas subia correndo o morro da praia Mole. São morros que exigem respeito!
Comecei a pedalar “na rua” este ano, em Porto Alegre. Antes, quando eu via alguém pedalando na faixa eu tb pensava “pessoa iluminada dotada de coordenação motora e esperteza que jamais terei”. Mas fui aos pouquinhos e acabei encontrando um grupo de meninas que pedalam juntas e estou aprendendo muito com elas.
Abraços.